Capítulo 11 - Desespero
Os
vómitos eram constantes. Acordava sempre mal disposta e enjoada. O peito estava
constantemente quente e dorido. A explicação da professora na aula de ciências
assustou-a. A descrição dos sintomas de gravidez batia certo com tudo o que a
professora descreveu. Contudo achava improvável, visto nunca lhe ter aparecido
a menstruação. Como poderia estar grávida?
Comprou
o teste no supermercado. A operadora de caixa, olhou-a de soslaio, e Deborah
sorriu replicando que provavelmente teria um mano a caminho. Correu para casa e
seguiu as indicações. As palmas da mão suavam de antecipação... Pousou o teste
na janela e aguardou os três minutos recomendados. Foram os piores três minutos
da vida dela. Assustou-se com o alarme do telemóvel. Três minutos já se tinham
passado. Aproximou-se, a medo, da janela. Fechou os olhos e rezou. Rezou muito
para que o resultado fosse negativo. Abriu os olhos e quase desmaiou.
O
sinal era de positivo. Deborah, vomitou e meteu a mão na barriga. E agora? E agora? O que
fazer? Contar à mãe? E quem era o pai? Como contar à mãe? Tirar o bebé? Lembrou-se
da história da Sara, do oitavo ano, que foi parar ao hospital e que quase
morreu por ter tentado tirar um bebé numa clínica clandestina. Contudo, nenhuma
clínica iria aceita-la sem a mãe. Só tinha 12 anos, por amor de Deus! E agora?
E agora? Ter este bebé não era a solução. A mãe nem podia sonhar que ela estava
grávida. Não ia aguentar. Ia perguntar quem lhe fez mal, quem a tocou? E agora?
Deborah,
meteu-se debaixo do chuveiro. Pensava melhor com a água a correr. O barulho
acalmava-a. Tinha que arranjar uma solução. Contar ao Diogo. Quem sabe ele
poderia levar-lhe à clínica? Inventar uma daquelas viagens que ele inventava
para a mãe e levar-lhe a uma clínica? E se ele quisesse ter o bebé? E se fosse
uma menina? E se ele quisesse mostrar o quanto a amava como fez com ela? Não.
Não podia contar ao Diogo.
Decidiu.
Foi para o quarto e preparou uma mochila. Colocou apenas algumas mudas de
roupa. Olhou para a figura de Nossa Senhora de Fátima e optou por deixa-la. A
mãe insistia que a santa era sua protetora. Deborah, gostava de saber que tipo
de proteção era aquela. Uma protetora que deixava o próprio pai abusar de uma
filha. Pai ou padrasto. Sempre tinha visto Diogo como um pai, até aperceber-se
da realidade. Que tipo de santa era esta?
Abriu
o mealheiro e levou as moedas e as notas. Ia para casa da tia. Lembrou-se que a
tia, em tempos, tinha sido enfermeira. Antes de se casar e ir para o Alentejo.
Raramente via a tia, porque raramente tinha contacto com a família do pai. Se o
pai não a quis, a família dele também não a devia querer. Contudo, a tia enviava
sempre cartões de Natal e presentes de aniversário. A tia podia ajudar. Ia
dizer-lhe que foi um namorado. Um rapaz qualquer. A tia ia acreditar. As miúdas
às vezes fazem coisas estúpidas.
Deixou
o quarto arrumado e fechou a porta. Apanhou o autocarro para a estação do
Oriente. Dali, aguardou o autocarro que lhe levasse para casa da tia. Tinha a
morada nos postais de Natal que ela enviava. Tinha pena... Sentiu-se mal por
nunca responder, mas a tia nunca desistiu dela. Não a ia abandonar.
Chegou
ao Alentejo, já se fazia tarde. Desligou o telemóvel porque a mãe e o Diogo não
se fartavam de lhe ligar. Apanhou um táxi até à casa da tia. Saiu do carro, com
as pernas a tremer, e caminhou lentamente até à porta de casa. A tia já estava
à porta, com as primas, gémeas, agarradas à perna.
-
Tia Neuza...
-
Deborah? És tu? – perguntou a tia enquanto olhava para ela de cima a baixo como
se procurasse alguma semelhança.
-
Sim... Tia... – Deborah, começou a chorar.
-
O que foi, meu amor? O que foi? Onde está a tua mãe? Deborah... Deborah, fala
comigo. – Tia...
Neuza
abraçou a sobrinha e levou-a para dentro de casa. As gémeas começaram a chorar
sem saber o que se passava. Afonso, desceu as escadas a gritar, preocupado. Os
miúdos agarram-se à mãe a chorar. Neuza, agarrou a sobrinha que não parava de
soluçar. Deborah, por mais que tentasse falar não tinha voz. As dores dos
últimos 6 anos da sua vida finalmente
tomaram forma...
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