Capítulo 17 - Onde está Deus?


Deborah, correu para dentro de casa assim que ouviu o grito da tia. Assim que entrou em casa e viu-a a segurar a barriga e a arrastar-se para o sofá, temeu o pior. Aconchegou-a no sofá e assustada perguntou o que podia fazer.
- Apanha o telemóvel que está na minha bolsa. – Disse apontando com dificuldade para o local onde tinha a mala.
Deborah despejou o conteúdo da mala e entregou o telefone à tia.
- Pedro... O teu filho... As águas rebentaram.
- Já? Tão cedo? Como pode?
- Não sei... Corre. Vai ter comigo ao hospital, por favor.
- Estou a voar, minha princesa.
- Vem devagar, amor.
- Vou com cuidado, mas devagar não vou.
Neuza, de seguida, ligou para a ambulância e para a sua mãe.
- Deborah, minha querida, achas que consegues ficar com as meninas e o Afonso, enquanto a avó não chega?
- A avó? A mãe do meu pai?
- Sim... A tua avó... Ela vem ficar com os meninos, mas não posso esperar, como vês.
Posso contar contigo para olhares por eles, meu anjo?
- Sim, tia, claro. Claro que pode.
- Ainda bem que cá estavas, meu anjo. Deus sabe o que faz.
- Eu... Vim porque não sabia mais para onde ir...
- Aqui estás segura. A ambulância está a chegar, vão ser uns dias atribulados. Só te peço para não ires embora até eu regressar, ok? E se fores... Se fores depois liga-me. Estou preocupada contigo, meu anjo.
- A tia tem muito mais coisas com que se preocupar do que comigo. Eu não mereço, nem que fale comigo. Não respondo às suas cartas.
- Meu anjo, e se não fossem as minhas cartas, tinhas corrido para mim?
- Não... – Deborah baixou os olhos em reconhecimento.
- Então sabes que podes sempre contar comigo.
-  Obrigada, tia...
Deborah, com as primas agarradas às suas calças, observou a tia a ser levada na ambulância. Afonso, tremia os lábios resultado da força que fazia para não chorar.
Sentaram-se todos no quarto das gémeas a fingir que estavam a beber chá. Afonso, juntou-se à brincadeira, pois não queria ficar sozinho. Deborah, ao olhar para os primos apercebeu-se de quanto tinha perdido por nunca ter feito contacto com a tia. Durante muito tempo não se tinha sentido como uma menina normal. Ali, a beber chá de faz-de-conta, Deborah regressou à infância que perdeu desde os seis anos.
As brincadeiras com o pai, ou seja com o Diogo, a incerteza de que seria correto, a dificuldade em guardar segredo à mãe... No inicio, pensou que seria normal, mas com o passar do tempo e as mentiras, e as viagens forçadas da mãe que Diogo inventava... Se fosse normal porquê a necessidade de esconder? Se fosse normal porque não demonstrar amor à frente de todos? Se fosse normal porque é que Diogo ficava dias sem olhar para ela nos olhos? Chegou a sentir-se ingrata. Chegou a pensar que não tinha demonstrado que amava o pai... Chegou a pensar que as ausências depois dos episódios eram culpa sua. E ali, com aquelas crianças, a ver a sua inocência percebeu que lhe foi roubada uma parte da sua alma, da sua alegria.
Como  é que ela, aos 12 anos, seria capaz de ter um filho? Um filho com o marido da própria mãe? Um filho com o homem a quem considerou pai? Como é que uma criança pode ter outra criança? Lembrou-se dos gritos da tia... Como seria possível que ela tivesse que passar por isso?
Não era justo! Deborah sempre quis ser boa menina. Tudo o que sempre fez foi para agradar a mãe e o suposto pai. Tudo o que sempre fez foi ser uma boa filha. Não era justo! Queria a infância que lhe foi roubada de volta. Sentiu o estômago a dar voltas e correu para a casa de banho. Estava farta disto. Não era justo! Onde estava Deus? A mãe e a avó sempre disseram que Deus protegia as boas meninas. Onde estava ele? Como permitiu que tal coisa acontecesse? 


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