Capítulo 18 - 48 Horas Depois



Diogo, ouviu pacientemente os médicos. Era oficial, Eva não apresentava sinais de atividade cerebral. Era o fim. Incrédulo, lembrou-se das mil e uma entrevistas sobre violência doméstica. Mulheres que apanhavam durante anos... A Eva bastou uma chapada... O mundo tinha se virado contra ele...
Em breve, a sogra chegaria ao hospital. Conseguiu mante-la afastada, acalmando-a que estava tudo bem, mas agora já não tinha como. Eva, estava ali deitada, mas já não estava. Sempre tinha sido pequena e esbelta como uma boneca, mas ali naquela cama parecia que tinha encolhido. Os cabelos castanhos tinham perdido a vivacidade, a pele brilhante, estava baça... A luz que a envolvia tinha desaparecido tal como a sua alma.
Diogo, estava completamente desnorteado. Eva, era a única constante e estabilidade na sua vida. Sem ela, estaria perdido. Nunca a amou como um homem ama uma mulher, simplesmente porque nasceu desprovido desse sentimento. Amou-a, sim. O facto de não sentir desejo sexual por ela não significava que não a amava. Ele é que tinha vindo com defeito. Amava o seu sorriso, a sua companhia, a forma como ela  o via como o melhor homem do mundo...
Uma chapada. Apenas uma chapada e ele tinha apagado a vida da única mulher que conseguiu ter a seu lado. E agora, estava ali desprovido de movimentos, sem saber para onde se virar. Devia contar a verdade... Ele matou-a... Não a encontrou caída em casa... Matou-a e tinha de pagar por isso. A polícia nem sequer questionou a veracidade da sua história. Não tinham motivos para duvidar. Para a sociedade Diogo e Eva Amaral eram a imagem da felicidade. Em tantos anos juntos nunca houve histórias de traições, discussões, separações... Era, para os media, o jogador de futebol mais chato do mundo...
Era incrível como as pessoas viviam de imagens. Ele, um monstro, era para a sociedade o modelo típico do homem perfeito. Bem sucedido profissionalmente, bem casado, bom pai... Esquecera-se por completo da Deborah! Não sabia o que havia de fazer. Já tinha ligado várias vezes mas o telemóvel estava desligado. Será que ela se tinha suicidado? Se tivesse ido à policia já o tinham ido buscar... A avó também não sabia dela. A tia, pelos vistos, também não sabia de nada. O pai... Será que Deborah tinha ido procurar o pai?
- Sr. Diogo... Sr Diogo... – o médico de serviço interrompeu-lhe os pensamentos. – Tem de tomar uma decisão...
- Não consigo pensar nisso agora. Este é um momento muito díficil...
- Eu entendo... Mas tem de tomar uma decisão. A sua esposa já não está entre nós. É a máquina que...
- Cale-se! Já disse que agora não quero pensar nisso...
- Não se exalte... A sua esposa era dadora de órgãos e estou apenas a garantir que se cumpra a sua vontade... Quanto mais cedo agirmos mais pessoas a Sra Eva pode ajudar.
- Não ouviu o que eu disse? Agora não! Por favor! A minha sogra deve estar a chegar... Dê-nos tempo para digerir esta notícia.
O médico afastou-se lentamente e Diogo só o conseguia desprezar. Como era possível? Os resultados dos exames tinham acabado de sair e já estavam a ver a Eva como se fosse um saco de compras. Já queriam levar tudo a saldo! Não podia fazer nada enquanto não encontrasse a Deborah! Ela tinha o direito de ver a mãe uma última vez. Ele poderia ser um monstro mas não a esse ponto! Tinha de a encontrar! Nos últimos dois dias tinha ficado no hospital agarrado à Eva, na esperança que ela acordasse... O impossível não iria acontecer.
A sogra chegou e abraçou-se a ele. Será que ela faria o mesmo se soubesse que foi ele que lhe matou a filha? Que tipo de monstro era ele?
- A Deborah? – perguntou a D. São enquanto procurava com os olhos. – Onde está a Deborah? Como é que ela reagiu a isto?
- A Deborah... Está com umas amigas... – Mais uma mentira, pensou. – Ela ainda não sabe de nada. Eu... Eu pensei que... Eu pensei que tinha sido só uma coisa pouca. Que a nossa Eva em breve iria para casa. Não quis preocupar a menina...
- Diogo! A Deborah tem de estar aqui junto com a mãe!
- Eu... Eu vou busca-la. Não se preocupe!
D. São olhou para a cama da filha e virou-se para ele.
- A minha filha, Diogo. A minha filha... A minha filha... Ela vai ficar bem, não vai?
- A sua filha... – Diogo, não quis dizer a verdade. – Vamos aguardar os exames dos médicos. Fique aqui com a Eva, eu vou buscar a Deborah. Dona São...
- Sim, meu filho...

Diogo, olhou para a sogra e começou a chorar. Um homem, apenas um homem tinha destruído a vida de três pessoas. Por ter sido cobarde e não ter tido coragem de assumir a própria natureza tinha destruído a vida de três pessoas. Três pessoas que o amavam e contavam com ele para tomar conta delas. Não sabia como iria conseguir continuar a viver com isto.


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