Capítulo 34 - Luta pela Sobrevivência

A porta não estava longe. Diogo só tinha que chegar até ela. Arrastou-se com bastante dificuldade. Não sentia as pernas... Melhor, não sentia o corpo. Não tinha sequer noção se estava realmente vivo. Só conseguia ver, com o único olho funcional, a luz que espreitava no pequeno espaço entre a porta e o chão. Tinha que tentar lá chegar antes que eles voltassem...
Tinha dificuldade em respirar. A dor que sentia quando inspirava quase que o fazia pensar duas vezes... O melhor, provavelmente, seria deixar de respirar de uma vez por todas. Não se conseguia levantar, tinha os dedos partidos, a cara era um saco de hematomas, o olho esquerdo tinha desaparecido por baixo dos inchaços... As costelas estavam partidas, quantas não sabia, mas estavam.
Não fazia noção de como tinha conseguido sobreviver ao ataque, mas fazia-lhe mais confusão a vontade que sentia de sobreviver. A lei da sobrevivência é algo de que sempre ouviu falar e agora entendia o que significava. Mesmo no final, bem perto do fim da vida e sabendo que não valemos nada, continuamos com a vontade de viver. Continuamos a lutar para respirar, para existir...
Acordou naquele espaço rodeado por vários homens encapuçados. A última imagem que tinha era dos pedaços do vidro do carro a caírem-lhe no colo e a ser arrastado para fora do carro. Acordou ali, nu e sem forma de se defender. Chamaram-no de pedófilo, monstro, abusador, nojento, doente... E infelizmente, tudo se adequava. Não sentiu que estava a ser ofendido, estava simplesmente a ser reconhecido pelo que era.
Cuspiram-lhe em cima, pontapearam-no no estômago, na cabeça, nas pernas... Pisaram-no e esmurraram-lhe a cara. Deixaram-no quase sem vida e pararam... Pensou que iam mata-lo de porrada, mas não. Afinal, era só inicio. Deixaram-no recuperar e voltaram horas depois...
Colocaram-no de barriga para baixo e agarraram-lhe nas pernas e nos braços, como se estivesse atado aos cantos opostos de uma cama. Tiraram a vez. Um a um, sodomizaram-no. Um a um, penetraram-no da forma mais violenta possível enquanto chamavam-no de pedófilo, de monstro, de animal... Pensou que ia morrer com as dores, com o ataque... Para mal dos seus males não morreu...
Ficou imóvel durante horas com o corpo a ferver de dores e a gelar com o sangue frio que se colava à pele. Perdeu a consciência várias vezes. Quis morrer... Quis sobreviver... Quis no mínimo sair dali para poder pedir perdão à Deborah. Apercebeu-se que não lhe chegou a pedir perdão. Não chegou a pedir desculpa por tudo que tinha feito. Aproveitou-se de uma criança inocente, confiada aos seus cuidados, e nem sequer teve coragem de pedir perdão. A última coisa que lhe pediu foi tempo... Tempo para arranjar uma mentira e fugir às consequências dos seus pecados. Era um lixo...
Quando finalmente conseguiu mover-se os homens voltaram. Atiraram-no para o canto com um jato à pressão. A força da água parecia que lhe ia retirar o pouco de pele que lhe restava. Não conseguia respirar. Estava a sufocar com a água que lhe entrava pelas narinas. Quis morrer... Mas não morreu...
Se não morresse pelos maus tratos, morreria à fome. Tinha perdido noção do tempo. Não sabia quantos dias se tinham passado, pareciam dias, mas não tinha ingerido nada. Não lhe deram nem sequer água. Percebeu que provavelmente queriam mata-lo, mas com tempo. Queriam que sofresse antes de morrer. A morte para ele seria fácil demais.
Não podia censurar quem quer que estivesse a fazer isso. O mundo não perdoava quem se aproveitava de crianças e muito provavelmente a confissão da Deborah já era conhecimento do mundo inteiro. Tinha o mundo contra ele. O mundo com razões mais do que suficientes para não querer que ele fizesse parte dele.
Os seus atacantes voltaram. Voltaram e abusaram novamente dele. Perguntavam se ele gostava de ser atacado? Perguntaram se sabia bem ser atacado sem forma de se defender? Pontapearam-no novamente, cuspiram-lhe em cima, esmurraram-no e deixaram-no para morrer. Mostraram-lhe a direção da porta. Disseram que não iriam voltar, que ele era livre de ir embora, se conseguisse...
Diogo, quis morrer mas não morreu e não tinha força para morrer... Parte dele continuava a querer viver. Não sabia bem porquê, mas queria viver. Não merecia fazer parte deste mundo mas queria viver. O que lhe esperava lá fora só poderia ser o inferno, mas queria viver. Queria pedir perdão à Deborah. Queria pedir-lhe para não gerar o filho, para não permitir que nascesse mais um monstro...

Arrastou-se. A porta não estava longe...

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