Capítulo 35 - Força Interior
Os jornalistas
amontoavam-se à porta do hospital. Era oficial: Eva Amaro estava clinicamente
morta e as máquinas tinham sido desligadas nesse mesmo dia.
A policia
tentava manter a ordem, enquanto os jornalistas empurravam-se uns aos outros na
esperança de conseguirem falar com a D. São. Como se estava a sentir? Como não
reparou nos abusos realizados por Diogo durante tantos anos? O Diogo não era o
pai biológico da Deborah, onde estava o pai? Quem ia ficar com a custódia da
criança? O que iam fazer com a suposta gravidez da Deborah? Onde estava o
Diogo?
D. São e Deborah,
escoltadas pelos seguranças, saíram pelo parque de estacionamento num carro de
policia à paisana. Os jornalistas estavam apinhados à porta da casa de Diogo e
Eva, à porta da casa de D. São, à porta do apartamento de solteiro de Diogo...
Não tinham onde se refugiar sem ser na casa de Neuza e muito em breve iriam
encontrar a ligação á herdade, mas por enquanto, por lá estavam longe do
assédio dos media.
Neuza,
recebeu-as à porta e abraçou a sobrinha. Deborah, tremia constantemente,
abalada pela morte da mãe.
- Não me despedi
da minha mãe, tia. Sai pela porta de casa e não me despedi dela.
- Deborah, não
podias imaginar que...
- Que nunca mais
a iria ver? – interrompeu com lágrimas nos olhos.
- Sim... Isso...
- Deborah. – D.
São ganhou forças para falar. – Não te martirizes, minha querida. Ninguém tinha
noção do que se iria passar. A vida é mesmo assim. Deus...
- Avó! Pare com
essa conversa! Deus não existe! Se existisse tinha salvo a minha mãe, não me
tinha deixado passar por isto...
- Minha querida,
os desígnios...
- D. São, com
muito respeito, por favor, aceite a opinião da Deborah. Cada um agarra-se ao
que pode neste momento, mas não podemos obrigar as pessoas a verem as coisas da
nossa maneira.
D. São olhou
para ambas e resignou-se. Com o terço na mão, recolheu-se para o quarto de
hóspedes e foi rezar. Sentia-se consumida pelo sentimento de culpa e tinha que
se agarrar a algo. Deus... Era mais uma provação. Algo a ser superado. Ela e a
neta iriam sair mais fortes, iriam encontrar o propósito na vida... Ajoelhou-se
e pediu a Deus por perdão. Perdão e clemência na hora de a julgar. E força,
muita força para conseguir tomar conta da neta e da criança que ela carregava
no ventre.
- Tia...
- Diz, meu amor.
- O tio Pedro?
Onde está?
- O tio Pedro...
– Neuza decidiu esconder a verdade à sobrinha. – Está em Lisboa a trabalho. Ele
por vezes ausenta-se durante algum tempo.
- Mesmo com o
bebé?
- O trabalho não
espera, meu amor.
Fez-se silêncio.
- Tia...
- Sim...
- Eu falei com o
Diogo antes de ir à policia. – Disse com lágrimas nos olhos.
- Conta-me tudo,
meu amor.
- Custou-me
muito porque tive que ser muito forte, tia. Não quis chorar à frente dele, mas
deu-me muita raiva. Não entendo, tia.
- Não entendes o
quê, meu amor?
- Ele era
suposto ser meu pai. Era suposto cuidar da minha mãe... Como é que ele pode
fazer isto connosco?
- As pessoas às
vezes... Deborah, as pessoas nem sempre pensam nas consequências. Mas, eu acho
que o Diogo estava doente. Eu acredito que pessoas como ele têm doenças do foro
mental, meu amor. E a tua mãe... Se o que ele diz for verdade... Foi um
acidente dentro de uma discussão... A chapada não foi um acidente e não se
justifica, mas cair justamente em cima da mesa ? Não sei, meu amor.
- Tia... E Deus?
Existe?
- Eu acredito
que sim. Deus é que te dá a força para estares aqui depois de tudo o que te
aconteceu. Deus deu-te a força para me procurares, para falares com a polícia.
A tua vontade de viver, a esperança que tens dentro de ti, isso é Deus. As
pessoas têm tendência em justificar as ações do homem como falta de ação de Deus. Mas nós, seres
humanos, somos livres de escolher. O que o teu padrasto fez foi uma escolha.
Escolheu aproveitar-se de uma criança inocente...
- E Deus, onde
estava?
- Somos biliões
de pessoas no mundo, Deborah. Deus dá-nos força interior, e temos de aprender a
escuta-la e a usa-la.
- Como? Eu era
uma criança... Sou...
- E foste capaz
de ir à policia, Deborah. Enfrentaste o teu padrasto. Porque achas que isso
foi?
- Porque chega,
tia. Ele tem de parar. Tem de responder pelos seus atos. Durante muitos anos
pensei que era normal, que era assim que se mostrava amor de pai para filha.
- E quando te
apercebeste que não era assim, o que fizeste?
- Comecei a
fugir... A evitar estar sozinha com ele... Quis contar à minha mãe... Quando
ele... Quando ele me tocava eu cantava na minha cabeça... Deixava-o usar o meu
corpo mas a minha alma não estava lá... E... Quando soube que estava grávida
fugi... Não ia deixar que isto voltasse a acontecer. Bastava... Tive de fazer
alguma coisa...
- Encontraste a
tua força interior minha filha... Encontraste Deus.
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