Capítulo 36 - Hospital de São Bernardo

Acordou com o gosto de lama e sangue na boca... Olhou à volta e só viu mato. Centenas de árvores gigantes cercavam-na. O corpo estava enterrado na poça de lama. Conseguiu soltar-se, a custo, e começou a andar sem destino. Não tinha sentido de direção mas decidiu seguir o sol. Teria de a levar a algum lado.
Precisava, desesperadamente, de água e de comida. Não tinha forças para continuar a andar. O corpo desidratado e sem forças desistiu. Encostou-se a uma árvore e desistiu da vida...
Ouviu passos. Sentiu o corpo a ser carregado. Ouviu vozes... Abriu os olhos e viu um vulto. O vulto, aos poucos, transformou-se na cara de uma mulher que lhe sorria.
- Beba... Beba água. A ajuda vem a caminho...
Maria, tentou abrir a boca para beber um gole de água mas não conseguiu. A mulher que a segurava molhou-lhe os lábios com um pano e espremeu.
- Assim é capaz de ser mais fácil. – Voltou a sorrir.
Maria, quis manter-se acordada mas não conseguiu. Voltou a fechar os olhos...
A luz magoou-lhe os olhos. Maria, cerrou-os e colocou a mão à frente antes de voltar a tentar abri-los. Estava numa maca. Os braços ligados a soro e máquinas que monitorizam os seus sinais vitais. Não era mau, significava que estava viva.
A enfermeira, assim que se apercebeu dos seus movimentos, carregou num botão e começou a fazer leituras. Num ápice, o pequeno quarto encheu-se de médicos e enfermeiras que a rodearam.
- Bem vinda. – Disse o médico que estava mesmo ao seu lado enquanto lhe media o pulso.
- Onde estou?
- Está no Hospital de São Bernardo, em Setúbal.
- Como vim cá parar?
- A senhora foi encontrada quase sem vida na Serra da Árrabida.
- Ah... – Maria suspirou... – Obrigada...
- Tem de agradecer ao casal que a encontrou. Como se chama?
- Maria... Maria Madalena.
- Maria, a policia está a caminho. Precisa de prestar algumas declarações. A Maria foi brutalmente agredida. Lembra-se de alguma coisa? Sabe quem foi?
- Eu... – Maria lembrou-se que não tinha documentos. – A polícia não! Por favor...
- É o protocolo do hospital, Maria. Temos de reportar estes casos. Eles só precisam que a Maria lhes explique o que se passou. Quanto mais informações mais fácil será encontrar o culpado.
- Eu... A policia, não. Peço-vos... – Tentou levantar-se da cama.
- Por favor, Maria. Não faça esforços, ainda está muito fragilizada. Surpreendentemente o seu bebé está bem!
- Bebé? Qual bebé?
- A Maria está grávida, não sabia?
- Grávida? – Maria, levou a mão à barriga.
Como seria possível? Pedro sempre usou precauções com ela, apesar de tudo nunca tiveram relações sem preservativo... Levou a mão à boca. Naquela noite... Com o Daniel... Fizeram amor sem pensar nas consequências.
- Isto não... Por favor... Gravidez, não.
- Está tudo bem, Maria. Temos uma equipa inteira para cuidar de si. Diga-me. É possível que o pai da criança seja o culpado? Foi ele que a agrediu?
- Não sei de nada...
- E sabe quem a atacou, Maria? É importante... Consegue lembrar-se?
- Não sei de nada... Só me lembro de ter acordado aqui, nesta cama. – Maria, mentiu.
- Qual a última coisa de que se lembra?
- Eu... Peguei na minha mala... Ia a caminho de um hotel... Não me lembro de mais nada!
- E vinha de onde? Lembra-se?
- Não me lembro! Não me lembro! Não me lembro! – Começou a gritar e a tentar levantar-se. – Tenho de sair daqui.
- Calma, Maria. Tenha calma. Não está em condições para ir a lado algum. Tenha calma. Há alguém que possamos contactar? O pai da criança?
- Não há ninguém...
- Os seus pais?
- Não há ninguém...

Fechou os olhos e deixou-se dormir. Não tinha forças para se manter acordada. Não podia trazer uma criança a este mundo. Não uma mulher como ela, manchada. Mais valia ter morrido... Mais valia ter-se afundado na poça onde Pedro a deixou.

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